Guilherme Augusto Siebeneichler
Pedagogo, Pós-graduando em Juventude no Mundo Contemporâneo (FAJE) e Educação, Tecnologia e Sociedade (IFPR)
Queridos amigos do Centro MAGIS Anchietanum, agradeço ao convite para desenvolver uma reflexão sobre a transformação das relações sociais, políticas e culturais em um contexto cada vez mais digitalizado. Ao me ater ao tema do Dia Internacional da Juventude nesse 12 de agosto, que tem por tema “Dos Cliques ao Progresso: Percursos Digitais para o Desenvolvimento Sustentável”. No âmago dessa discussão está o ciberativismo, uma forma emergente de mobilização que utiliza as plataformas digitais como ferramentas centrais para a ação social. Nessa perspectiva, essa prática não só redefine as noções de ativismo, mas também remodela a forma como os jovens se engajam na luta por direitos e na construção de um futuro mais sustentável.
Para iniciar nossa reflexão, gostaria de tratar sobre o surgimento do ciberativismo:
O termo “ciberativismo” surgiu nos anos 1990 para indicar uma ampla e heterogênea quantidade de movimentos, caracterizados por um novo tipo de participação que ocorria por meio do uso das tecnologias digitais e começava a se manifestar em diversas partes do mundo. Esse tipo de ativismo midiático tinha nas tecnologias digitais de comunicação um válido instrumento para reforçar as organizações, seja local ou globalmente, permitindo a coleta capilar de fundos, facilitando a coordenação internacional de campanhas e protestos, obtendo e difundindo informações, denúncias e petições. Em termos gerais, nessa primeira fase, o ciberativismo referia-se ao uso da Internet para dar suporte aos movimentos globais e às causas locais, utilizando as arquiteturas informativas do primeiro tipo de Internet para disseminar informações, promover a discussão coletiva de ideias e a proposta de ações, criando canais de participação e difundindo estilos e práticas experimentais de conflitualidade. (FELICE, 2017, p.101).
Podemos chegar à compreensão de que o ciberativismo, ou ativismo digital, surge como uma resposta ao ambiente contemporâneo em que as fronteiras físicas são desafiadas pela interconectividade proporcionada pela internet. Jovens ativistas, imersos em uma cultura digital, tornam-se protagonistas em movimentos que transcendem os limites geográficos e sociais, nas palavras de Di Felice (2017, p.53):
[…] Uma nova ecologia comunicativa pouco a pouco reuniu mundos, até pouco tempo antes, desconhecidos e sem comunicação entre si, tornando-os próximos e interagentes.
Essa participação juvenil nas redes vai além da simples adesão a causas; ela se manifesta na criação de conteúdos, na organização de protestos virtuais, na mobilização de comunidades online e na articulação de agendas políticas. Em um cenário onde os cliques podem gerar mobilizações massivas, os jovens são capazes de construir narrativas e de pressionar por mudanças, influenciando decisivamente na agenda pública e na garantia de direitos.
As redes digitais oferecem um espaço dinâmico onde as interações sociais são reconfiguradas. A conectividade permite que jovens de diferentes contextos socioeconômicos, culturais e geográficos se conectem, compartilhem experiências e ideias, e construam coletivamente estratégias para enfrentar desafios globais como as mudanças climáticas, a desigualdade social e a violação de direitos humanos. No entanto, essa potencialidade das redes em promover a inclusão e a diversidade também está sujeita a tensões. O acesso desigual à internet e o controle sobre as plataformas digitais podem reproduzir e até mesmo intensificar as desigualdades sociais, limitando o alcance e a eficácia das ações de ciberativismo. Além disso, o excesso de informações e a disseminação de fake news colocam em risco a qualidade das mobilizações e a própria legitimidade das demandas apresentadas.
É importante salientar que, para além das relações entre humanos, as redes também nos colocam de frente com a relação com sujeitos não-humanos, assim como nos destaca Lévy (1999) em seu livro “Cibercultura”, na voz do autor:
O ciberespaço não compreende apenas materiais, informações e seres humanos, é também constituído e povoado por seres estranhos, meio textos, meio máquinas, meio atores, meio cenários: os programas. Um programa, ou software, é uma lista bastante organizada de instruções codificadas, destinadas a fazer com que um ou mais processadores executem uma tarefa. Através dos circuitos que comandam os programas interpretam dados agem sobre informações transformam outros programas fazem funcionar computadores e redes acionam máquinas físicas viajam reproduzem-se etc. (LÉVY, 1999, p.41).
Desse modo, a garantia de direitos emerge como uma questão central. O ciberativismo, ao se articular em torno da defesa de direitos humanos, ambientais e sociais, promove um debate sobre o papel das tecnologias digitais na construção de um desenvolvimento sustentável e inclusivo. A luta por direitos, especialmente entre os jovens, está intrinsicamente ligada à demanda por um ambiente digital que respeite a liberdade de expressão, a privacidade e a acessibilidade. Para que os cliques possam efetivamente se transformar em progresso, é necessário que as plataformas digitais sejam reguladas de forma a proteger os direitos dos usuários e a promover a equidade de acesso e participação.
Por fim, é necessário nos instrumentalizar de ferramentas para entender como os jovens se apropriam das tecnologias digitais não apenas como instrumentos de ação, mas como espaços de construção de identidade e cidadania. O ciberativismo juvenil é uma expressão da busca por pertencimento e reconhecimento em uma sociedade globalizada, onde as lutas por direitos e sustentabilidade estão cada vez mais interligadas. O desafio, portanto, é garantir que esses percursos digitais conduzam a um desenvolvimento que seja verdadeiramente inclusivo, sustentável e que respeite as diversas vozes que ecoam nas redes.
Assim, a relação entre ciberativismo, redes digitais e a garantia de direitos destaca a complexidade dos desafios enfrentados na busca por um desenvolvimento sustentável. Os jovens, ao se mobilizarem por meio das tecnologias digitais, revelam não só o potencial transformador das novas formas de ativismo, mas também as limitações e os riscos que essas práticas enfrentam em um mundo cada vez mais digitalizado. A luta pelo progresso sustentável, portanto, passa pela necessidade de garantir que as ferramentas digitais sejam usadas de forma ética e inclusiva, promovendo uma sociedade mais justa e equitativa para todos.
REFERÊNCIAS
FELICE, Massimo di. Net-ativismo: da ação social para o ato conectivo. São Paulo: Paulus, 2017. 288 p.
LÉVY, Pierre; DUARTE, Milton Fernandes. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999. 264 p. Tradução: Carlos Irineu da Costa.